Quarta à tarde!
Ao início da noite, no prédio dela há uma criança que grita. Grita muito. Quase todos os dias, durante muito tempo, uma hora quase da última vez que se lembrou de contabilizar. A criança grita de forma aflitiva e vão-se ouvindo as vozes dos pais, a tentar apaziguá-la, imagina ela, mas o choro gritado continua.
No prédio dela, ao fim da tarde, há ainda uma cadela que tem um ladrar irritante, no mínimo, irritante… De vez em quando, vezes de mais, ela ladra, muitos minutos seguidos, provavelmente à espera que o casal seu dono a leve à rua… e um dos dois lá acaba por levar… Durante a noite a cadela acorda e patinha pela casa, fazendo ecoar no teto do quarto dela o som que ganha contornos estridentes no silêncio da noite… E, por vezes, também ladra de noite.
No hospital da cidade dela, como em todos os hospitais, em todas as cidades do país, não há estacionamento para toda a gente. Pacientes, acompanhantes, enfermeiros, funcionários, talvez médicos também, todos esperam que as letras luminosas alterem do vermelho ocupado para o verde livre. E, a conta-gotas, lá vão entrando nos parques, quando alguém retira o seu carro. A espera enerva, faz calor, os minutos passam e já devíamos estar lá dentro na consulta, na radiografia, sei lá onde. Quando lá chegamos vamos extenuados, sem paciência para nada e depois esperamos… Claro que temos que aguardar, faz parte. Mas quando pessoas que chegaram depois passam à frente a coisa fica ainda mais stressante e acabamos por perceber que o pedido da radiografia da pessoa com quem estamos, que tem dores, ficou “esquecida” na secretária… Duas horas depois a coisa lá se faz. Claro que, entretanto, a médica que veria o exame já saiu! Terá que estar noutro local talvez… não lhe cabe duvidar! Amanhã alguém verá o joelho do miúdo, em modo osso!
E depois há o trânsito da cidade dela, de todas as cidades, e esta até nem é assim tão grande. Gente que circula a 35km à hora, gente que passa a abrir, gente que não faz pisca e vira, gente que vira demorada e pausadamente e para que todos os outros vejam bem para onde vai, gente que isto, gente que aquilo!
Num dos supermercados da cidade dela, em todas com certeza, há apenas duas caixas a trabalhar. Está bem, calmamente esperamos. Numa das caixas o funcionário conta moedas e intuímos que abrirá a caixa entretanto, mas todos aguardam civilizadamente a sua vez nas restantes. Claro que, quando a caixa abre e se diz que “podem avançar para a caixa x pela mesma ordem” um senhor mal encarado já lá está, vindo algures dos confins das prateleiras, e coloca os seus produtos. Numa maravilhosa expressão de civismo passa à frente de tudo e todos! Talvez estivesse grávido e fosse prioritário! Barriga tinha.
Finalmente, por hoje, na casa dela, tenta ligar o computador e nada. Em casa dela, há, como talvez em muitas outras, registo de 5 ou 6, talvez 7 carregadores do portátil queimados, estragados pelo uso diário e instalações elétricas inconstantes. Sim, o computador é velho e tem muita rodagem, precisa de um novo para se reformar. Aguenta-te máquina que a vida é dura e tu tens que ser mais!
Foi sem dúvida a cereja no topo do bolo de uma tarde típica de uma qualquer mulher, ou homem, numa qualquer cidade no país dela. Escrever sobre ele porquê? Porque foi a tarde do dia dela e foi uma tarde aborrecida, só para não dizer chata, porque isso não se diz. E porque ela expurga irritações a escrever sobre elas... às vezes! Até amanhã! :)